Emoções Decidem Jogos? O Que Todo Atleta Precisa Saber Sobre Sentir e Escolher
- Markus Lothar Fourier

- 15 de jul.
- 4 min de leitura
Atualizado: 24 de ago.

Imagine a seguinte cena: o jogo está empatado, restam poucos segundos, e você tem a bola. Toma a decisão certa e vira herói — ou erra e vê tudo desabar. Agora, pare e pense: o que realmente guiou sua escolha? A tática? A técnica? Ou... as emoções?
Se você acha que o fator emocional entra só depois do jogo, como frustração por perder ou euforia pela vitória, talvez seja hora de rever esse pensamento. Emoções não são só reações ao que acontece — elas também moldam o que a gente faz, principalmente quando o jogo aperta.
Emoção e decisão: a dupla inseparável
Por muito tempo, a ciência do esporte focou em aspectos técnicos, físicos e cognitivos. Mas estudos recentes têm mostrado que atletas — de xadrez, passando pelo tênis e até o futebol — não são apenas máquinas racionais. Sentem, e muito. E essas emoções influenciam diretamente suas decisões em campo, na quadra ou no tabuleiro.
No xadrez, por exemplo, pesquisadores usaram tecnologias como rastreamento ocular, análise facial e até sensores de postura para observar como os jogadores reagem durante problemas difíceis. O resultado? Emoções mudam o tempo todo, em segundos. Raiva, medo, dúvida, entusiasmo... tudo isso aparece enquanto o jogador escolhe o próximo movimento.
E mais importante: essas emoções não são só "barulho". Elas funcionam como atalhos mentais — guias que ajudam (ou atrapalham) o cérebro a decidir onde focar e o que ignorar. Quando um jogador reconhece um padrão parecido, como um movimento no corpo do adversário ou um efeito na bola, a emoção associada a ele pode acelerar a decisão. Como se o corpo dissesse: “isso aqui já deu certo antes, vai fundo”.
Emoções: vilãs ou aliadas?
Tudo depende. Emoções negativas, como ansiedade, medo, frustração ou raiva, podem nos levar a escolhas precipitadas, defensivas ou desorganizadas, como podem nos dar energia, aumentar nossa precaução e cuidado. O mesmo vale para as emoções ditas positivas. Elas podem ajudar a manter o foco, motivar e dar confiança, mas em excesso, pode nos fazer assumir riscos desnecessários e perder detalhes importantes.
A chave aqui não é “sentir só coisas boas”, até porque isso é impossível. A emoção não é o problema. O problema é não saber reconhecê-la e não saber o que fazer com ela. Um estudo mostrou que atletas que conseguem regular suas emoções — isto é, não se deixam dominar por elas, mas também não tentam ignorá-las — tendem a tomar decisões mais inteligentes sob pressão.
E as crenças? Elas entram na jogada também
Além das emoções, o que você acredita sobre si mesmo e sobre o adversário também entra em campo. Se você acha que “não é bom sob pressão” ou que “o outro está num momento melhor”, já começa a jogada perdendo. Essas crenças, mesmo inconscientes, moldam o jeito como você vê a partida, interpreta os sinais e escolhe suas ações.
Em termos técnicos, isso envolve processos cerebrais como a teoria da mente (a capacidade de imaginar o que o outro está pensando) e a regulação de expectativas. Seu cérebro não só joga o jogo: ele simula cenários o tempo todo, com base nas emoções e crenças que você carrega.
O que tudo isso tem a ver com você, atleta?
Se você já se pegou dizendo “na hora eu travei”, ou “eu sabia o que fazer, mas fiz outra coisa”, provavelmente foi a emoção — e não a técnica — que decidiu por você. O bom é que isso pode ser treinado.
Três dicas práticas:
Reconheça o que sente – Nomear a emoção já é meio caminho andado. É ansiedade? Raiva? Medo? Não lute contra ela — escute.
Desenvolva estratégias de regulação – Técnicas como respiração, reestruturação de pensamento (“isso não é uma final de Copa, é só mais um ponto”) e ancoragem sensorial ajudam a manter o controle sem suprimir o que se sente.
Treine o emocional como treina o físico – Não espere a final para lidar com nervosismo. Simule pressão, converse sobre crenças limitantes e trabalhe com apoio profissional se necessário.
Para resumir
Emoções não são um obstáculo à performance. Elas são parte dela. Ignorar isso é jogar com uma venda nos olhos. Mas aprender a usar as emoções como aliadas — isso sim pode ser o diferencial entre um atleta comum e um que decide jogos. É isso que temos visto atualmente em muitos esportes.
No fim das contas, sentir não é fraqueza. É ferramenta e você precisa saber usá-la.
Referências
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